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Luciano Feltrin
Poucos meses após ser adotada, a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013) já provoca seus primeiros efeitos na rotina das corporações. Empresas e empresários estão revendo ou criando códigos de conduta com o objetivo de ampliar mecanismos de controle e transparência. Nesse sentido, a certificação de terceiros e fornecedores é um movimento mundial, observa a advogada Shin Jae Kim, corresponsável pela área de Compliance de TozziniFreire Advogados.
Que balanço você faz da Lei Anticorrupção após alguns meses em vigor no País?
Nos últimos dez meses, a Lei Anticorrupção gerou um interesse e uma repercussão que eu nunca tinha visto, seja na mídia ou em eventos sobre o assunto. No momento em que o tema corrupção é o mais discutido pela sociedade na campanha política falar da responsabilidade das empresas é bom. Nesse sentido, o saldo é positivo.
No fim do dia, a discussão ajuda a entender qual é o papel das empresas como elemento de uma sociedade democrática e de que forma empresas e empresários precisam se conscientizar para reduzir riscos potenciais de uma possível violação de conduta.
As empresas receberam bem a questão da responsabilidade objetiva [que pode responsabilizá-las mesmo sem a comprovação de que houve intenção dos dirigentes ou donos]?
A questão da responsabilidade objetiva fez com que aumentasse muito a preocupação com a própria conduta e também com a de quem representa o nome da empresa, caso de fornecedores e prestadores de serviços. Hoje, as empresas estão se movimentando e treinando funcionários e parceiros de negócios. A certificação de terceiros e fornecedores é uma tendência mundial. É, aliás, onde mora o maior risco. Só não enxerga quem não quer.
O que exatamente um bom programa de compliance deve conter para reduzir riscos?
O escritório é muito demandado no que diz respeito a isso. A lei estabelece que adotar mecanismos de prevenção tem peso favorável. Assim, compliance é muito mais do que ter cuidado nas relações entre empresa e governo. É um conjunto mais amplo de relações empresariais a ser considerado.
A questão da corrupção é o carro-chefe, até por conta da lei, mas implantar um bom programa de compliance deve ser muito mais. Para isso é preciso avaliar bem os riscos da empresa e do setor em ela que atua para depois montar um bom plano ou aprimorar algo que já existe. Não é preciso adotar um código de ética de mais de 200 páginas. Ninguém vai ler. É preciso fazer algo mais simples que garanta a melhoria dos controles internos e que as pessoas possam assimilar.
Qual o papel de donos, sócios ou diretores das organizações?
Fundamental. No fundo, quem deve tomar a decisão de fazer a coisa correta são os altos executivos, o diretor, o presidente, o dono. É preciso lembrar que alguns casos de corrupção e cartel estão vindo à tona só agora, mais de 20 anos depois de terem ocorrido. A questão é que administradores e controladores precisam tomar essa decisão e, assim, mostrar qual direção a empresa deve seguir quando ele se aposentar e estiver tomando caipirinha na praia.
É, então, uma questão de calibrar a cultura corporativa?
Exato. O que traz eficácia a um programa de compliance é o dono dizer: isso aqui não vai mais acontecer. São pequenos sinais que você dá para as organizações e elas vão entendendo e capturando essas mudanças.
Num primeiro momento, as empresas diziam que a nova lei, embora bastante positiva, significaria mais custos. Como convencer os empresários de que boas práticas e transparência podem representar, no futuro, também ganhos para a organização?
Se você quer crescer, ter clientes internacionais, e seu negócio depende disso, não há como não se ajustar à lei. Claro que, se for uma grande empresa, o custo será maior mesmo.
A conectividade provoca isso [convencimento]. As pessoas veem as novas tendências surgirem e vão atrás. Compliance officer é um cargo cada vez mais valorizado nas organizações. Há também o aumento dos recursos voltados à área de compliance. É preciso estar atento aos diferentes movimentos para implantar algo mais efetivo. E esse movimento de mudança é mundial. Ocorre, por exemplo, no Japão, Canadá, Estados Unidos e Alemanha.
É fácil ser uma empresa ética e transparente no Brasil?
Não é fácil. As pressões do negócio e o dia e dia colocam os empresários numa zona cinzenta, mas é preciso adotar uma política de tolerância zero com certas condutas [caixa dois, por exemplo]. As empresas que lidam com governos e têm contratos com eles precisam ficar muito atentas. Os últimos casos de cartéis no Cade revelam que há uma ignorância generalizada sobre o que pode ou não se pode fazer na relação com os concorrentes. Violação de crimes concorrenciais tem dado cadeia.
É necessário, de certa forma, selecionar clientes e fornecedores?
Sim. É preciso saber escolher seus parceiros de negócios e seus clientes pelas práticas que adotam e controles internos que possuem. Claro que isso tem um ônus, mas, na minha avaliação, é o que deve ser feito.
É crescente o número de profissionais que contrata seguro de responsabilidade civil. Como você vê isso?
Essa apólice é um complemento importante, uma precaução a mais que executivos e diretores devem ter. De qualquer forma é preciso lembrar que ela não cobre dolo e, no âmbito penal, o executivo pode ter de responder perante a Justiça. Se você não cuidou dos riscos, vai ter de gastar com sua defesa e o seguro pode ajudar nesse sentido. No fim do dia, quem vai ter de se defender será mesmo o indivíduo.
O que falta para que a Lei Anticorrupção “pegue” de uma vez por todas no País?
Está faltando – e isso é de certa forma frustrante – um decreto para regulamentar a lei. Esperamos que ele seja publicado em breve.
Poucos meses após ser adotada, a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013) já provoca seus primeiros efeitos na rotina das corporações. Empresas e empresários estão revendo ou criando códigos de conduta com o objetivo de ampliar mecanismos de controle e transparência.
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