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A Lei Complementar nº 157/2016, publicada em 30 de dezembro de 2016, reforma o Imposto sobre Serviços de qualquer natureza – ISS, incluindo todos os serviços de streaming de áudio e vídeo, como Netflix e Spotify, que passarão a pagar o imposto, causando o aumento do valor das mensalidades cobradas dos usuários.
Em entrevista ao Portal Dedução, o advogado Evandro Grili, sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes debate sobre a legitimidade da lei, uma vez que a disponibilização de mídia por streaming não se caracteriza como serviço, mas sim como cessão de uso, e outras controvérsias.
A partir de 1º de abril de 2017, quando a Lei Complementar nº 157/2016 entrar em vigor, a alíquota mínima do ISS será de 2%. Outra novidade é a proibição para que o tributo seja objeto de benefícios e isenções fiscais. Qual sua opinião sobre este fato?
Inicialmente, é preciso fazer um esclarecimento. A LC nº 157/2016 já está em vigor, desde que publicada. A LC 157 não cria tributo. Ela estabelece competência para os municípios criarem e cobrarem o ISS sobre os serviços de streaming. Sendo assim, não está sujeita ao princípio ao prazo de 90 dias da regra da anterioridade. Para que esses tributos sejam cobrados, cada um dos municípios brasileiros precisam criar suas respectivas leis municipais. Estas leis municipais é que estão sujeitas ao princípio da anterioridade. E, nessa linha, para exigir tributo, uma lei nova (no caso municipal, porque estamos falando de ISS, precisa atender a: primeiro, ser publicada no exercício anterior ao que se pretende cobrar; segundo, aguardar prazo de vigência de 90 dias (anterioridade nonagesimal). Assim, aqueles municípios que quiserem começar a cobrar o novo tributo em 1º de janeiro de 2018 precisam aprovar a lei ainda em 2017, até o dia 30 de setembro de 2017.
A proibições de isenções pela LC é uma novidade?
Sim, isso é uma novidade apenas em nível de legislação infraconstitucional. Contudo, a Constituição já prevê claramente que a alíquota mínima deveria ser de 2%. Ou seja, a Constituição já sinalizava, para o ISS, que não poderia haver isenções, ou cobranças menores do que 2%. De qualquer forma, é, sim, um reforço à redução da guerra fiscal. Mas, particularmente, entendo que a lei não fechou todas as portas. Não há proibições, por exemplo, para alguns serviços, de se permitir reduções de base cálculo, ou menos de deduções de custos de materiais usados na prestação de serviços, etc. Isso, se tratado pela legislação dos municípios, pode reduzir a carga tributária e iniciar um novo foco de guerra fiscal.
O ISS de streaming é um tributo inconstitucional?
Particularmente, entendo que esse ISS sobre streamings é um tributo inconstitucional, que nem mesmo pode ser cobrado. Explico: Os serviços caracterizam-se, normalmente, por prestações de obrigações de fazer. Por exemplo, quando eu vou a um cabeleireiro pra cortar o cabelo, ele usa a sua habilidade técnica para me atender, dentro daquilo que eu quero e encomendo a ele. O serviço tem esse caráter personalíssimo da obrigação de fazer, em que eu encomendo algo que me é pessoal e que serve a mim e não a outro. Quando contratamos empresas como Netflix ou Spotify, essas empresas não estão obrigadas a nos prestar uma obrigação de fazer. Mas sim estão obrigadas a nos prestar uma obrigação de dar. No caso específico destes streamings, eles nos “dão”, por meio de cessão de direitos, o acesso a conteúdos de vídeos e música, que negociaram junto aos titulares destas obras cinematográficas ou musicais. É típica obrigação de dar, que não se caracteriza como serviço.
O Supremo Tribunal Federal – STF, tempos atrás, ao julgar o ISS que se pretendia cobrar da locação de bens móveis, adotou essa premissa e disse que o tributo era indevido e não poderia ser cobrado. Até chegou a editar a Súmula Vinculante no 31, que veda a cobrança de ISS sobre a locação de bens móveis, justamente, porque se tratavam de obrigação de dar e não de obrigações de fazer. Se o STF usar a mesma premissa, caso seja provocado a decidir a questão, pode ser que também o ISS sobre streamings seja considerado inconstitucional. É o que acreditamos que vá acontecer. Mas, pra que isso ocorra é necessário que os streamings contestem a cobrança na Justiça. Se eles aceitarem a tributação, sem questioná-la judicialmente, o Judiciário nem mesmo vai se manifestar sobre o assunto e o imposto acaba se tornando “devido”, até que alguém resolva questionar.
O artigo 8ºA da lei determinou a regra geral a ser seguida pelos municípios e pelo Distrito Federal da alíquota mínima de 2% para o ISS. Isso significa que não poderá haver por parte destes entes a edição de legislação que preveja alíquota inferior. Com essa legislação, o senhor acredita que findará a guerra fiscal entre os municípios, que diminuem a taxa de ISS para atrair mais empresas para a localidade?
Essa previsão já existia na LC nº 116/2003, que sofreu alterações pela LC nº 157/2003. O marco regulatório do ISS ainda é a LC nº 116, agora com as alterações promovidas pela LC nº 157.
Sem dúvida que essa é uma boa medida para se evitar a guerra fiscal. Até porque, na prática, os municípios todos acabam “nivelando por baixo” e fixando a alíquota no patamar mínimo de 2%, justamente para evitar a fuga de empresas de seu território. De qualquer forma, como já mencionamos na resposta anterior, ainda há outros caminhos para redução da carga tributária e brechas para guerras fiscais entre cidades vizinhas.
Essa regra do ISS é absoluta ou será permitido conceder isenções para alguns setores?
Não será permitido. Se o serviço estiver descrito na Lista Anexa da LC nº 116/2003, com as alterações promovidas pela LC nº 157, os municípios deverão tributar com alíquotas que podem variar entre 2% e 5%, sem qualquer possibilidade de isenção tributária daqueles serviços cujo ISS pode ser cobrado.
A matéria impõe ainda alíquota mínima de 2% sobre o valor de serviços de plataforma de streaming, como Netflix, Spotify e HBO Go, por exemplo, e a cobrança de ISS sobre os conteúdos de áudio, imagem, vídeo e texto por meio da internet. Há possibilidades de esses aumentos serem repassados para o consumidor?
Sim, se o imposto for cobrado dos streamings e eles resolverem pagar, sem fazer nenhum questionamento da cobrança junto ao Poder Judiciário, é muito provável que os valores cobrados serão repassados aos consumidores assinantes destes streamings. É uma regra de mercado. Aumentam os custos tributários, o preço sobe…
As cobranças das taxas de ISS poderão variar de acordo com cada município? Isso pode gerar polêmica?
A regra é de que a alíquota seja de, no mínimo, 2%, e, no máximo, 5%. Dentro destes patamares cada município tem liberdade para fixar a sua alíquota, por meio de suas leis municipais específicas. O que vai acontecer é que as empresas, certamente, vão fixar seus domicílios em cidades que cobrem o patamar mínimo.
No Brasil há mais de cinco mil municípios e todos estão ávidos por receita tributária, ainda mais em tempos de crise como estes que estamos vivenciando. Com essas novas regras, pode haver uma crescente tensão entre entes públicos e contribuintes?
Toda vez que se cria um novo tributo, há sempre um ponto de tensão entre o fisco e o contribuinte. A primeira coisa a fazer é verificar se esse tributo é constitucional, se é devido etc. Afinal, é tradição em nosso País a criação de vários tributos que depois foram declarados inconstitucionais pelo Judiciário.
Um estudo da Confederação Nacional de Municípios – CNM estima que as novas regras podem garantir uma arrecadação extra de R$ 6 bilhões aos municípios. Qual sua opinião sobre isso?
Olha, francamente, não conheço o estudo. Mas se estivermos falando só de streamings de vídeos, imagens, música e textos, francamente, acho que os valores estão superestimados. R$ 6 bilhões de arrecadação, levando em conta uma alíquota de 2% (que deve ser a tendência adotada pela esmagadora maioria dos municípios) significa um movimento de assinaturas de quase R$ 300 bilhões de reais. É como disse, não conheço o estudo, mas não creio que ainda tenhamos um movimento anual desse porte nesse setor da economia. Isso, sem contar que novas tecnologias surgem em todo momento, modificando e barateando os custos deste tipo de assinatura, o que pode gerar até uma redução do valor total do mercado, e, consequentemente, reduções de arrecadação. Enfim… Vamos ter que aguardar um pouco mais para fazer estas estimativas.
Os municípios terão um ano para revogar normas que contrariem a reforma do ISS. Este prazo é adequado?
Não vejo que os municípios tenham, obrigatoriamente, que revogar normas que contrariem a Lei Complementar no 157 ou mesmo a LC nº 116/2013. Estas normas, por si só, já estão revogadas se contrariarem a Lei Complementar do ISS. É uma regra de direito, a revogação tácita, que se aplica aqui. De qualquer forma, o prazo de um ano seria sim adequado, caso algum município queira revogar expressamente dispositivos que não se coadunam mais com a legislação complementar vigente sobre a matéria.
A nova lei proíbe a concessão de isenções, incentivos e benefícios tributários ou financeiros, inclusive redução da base de cálculo ou crédito presumido. Na prática, isso é bom ou ruim para a sociedade, de forma geral?
É interessante, porque reduz possibilidades de guerra fiscal. Contudo, como já disse, ainda há brechas para, em alguns tipos de serviços sujeitos ao ISS, haver mecanismos de redução da carga tributária, por meio de deduções, por exemplo.
A Lei Complementar nº 157/2016, publicada em 30 de dezembro de 2016, reforma o Imposto sobre Serviços de qualquer natureza – ISS, incluindo todos os serviços de streaming de áudio e vídeo, como Netflix e Spotify, que passarão a pagar o imposto
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