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Autor: Gustavo Ziller
“Qualquer pessoa pode cozinhar”. É o que diz o chef Gusteau no longa de animação “Ratatouille”. Em tradução livre Zillermânica “um grande talento pode surgir de qualquer lugar” ou “não limite o interesse de alguém antes da experimentação”. A animação da Pixar desenvolve o roteiro em cima desta máxima: se eu posso, por que você não pode?
Conheci o Alphonse Voigt, fundador da EBANX, no início deste ano, em Belo Horizonte, em um evento da Endeavor. Ele, no palco, contando sua história de vida. Eu, na plateia, ouvindo atentamente. Durante a apresentação, os pontos que Alphonse explorava me faziam pensar mais, acelerava meu sangue como nunca tinha acontecido em palestras — com exceção de quando você é o palestrante — aí o nervosismo toma conta e a descarga de adrenalina faz o resto. Mas, ali, na plateia? Nossa, foi intenso.
Fomos apresentados pela turma da Endeavor logo que Alphonse desceu do palco. Em vinte segundos de introdução, nos conectamos. Empatia é isso. A ficha cai de forma rápida, e as melhores amizades começam quando a conexão é imediata, entende? De lá pra cá, nos falamos por email, por telefone, mas sempre com aquela sensação de que nos conhecemos há anos.
E várias das nossas conversas eram relacionadas a um tema que eu me jogo desde minha inflexão em 2012: a Vida Criativa. Aquela história de que você sai do lugar para experimentar o que o lugar anterior não consegue te proporcionar, “um passo à frente e você não está mais no mesmo lugar”.
Corta para 2005
Alphonse é daqueles que se jogam na vida. Está surfista, está empreendedor e também paraquedista. Em novembro de 2005, tinha na caderneta cerca de mil saltos, o que o tornava um paraquedista bem experiente. Em um voo de fim de tarde, em Paranaguá, litoral do Paraná, Alphonse se preparou para um pouso em alta velocidade, mais um para o extenso currículo, mas, por um instante, ele se desconcentrou quando uma criança apontou na sua área de pouso.
Naquele piscar de olhos de sua aproximação final, ele chegou muito rápido para o pouso e perdeu o tempo do freio (no paraquedismo, flare). Bateu forte. No hospital foi detectada grave fratura de coluna lombar, com achatamento severo da vértebra L1. O conjunto da obra empurrou a medula para trás, mas não a rompeu completamente. Entrou direto para cirurgia. Depois, já no quarto, não sentia suas pernas. Estava paralisado da cintura para baixo.
Com uma força imensa e ajuda de diversos profissionais e terapias, Alphonse recuperou grande parte dos movimentos, voltou a andar e até a praticar alguns esportes, digamos, mais atrevidos. Manteve a Vida Criativa no tratamento, e depois dele. Fundou uma nova empresa, ressignificou sua vida, e se jogou na máxima novamente: se eu posso, por que você não pode?
Volta para 2016
Chamado do WhatsApp, “Zillermano, missão pra você!”. “Salve, camarada, o que manda?” Toca o telefone, o cara na linha. “Cai pra Curitiba para fazer uma palestra no EBANX , depois vamos comigo para Foz do Iguaçu em um dos mais completos centros de paraquedismo do mundo, de um brother, o Thiago Peretti.
Põe no Youtube aí e saca o cara?” “Mas, Alphonse, qual a idea?” “Ziller, vou saltar, cara, preciso fazer isso, e tô levando meu fisioterapeuta, um dos meus sócios e o Thiago como mentor. Vem com a gente!”
Nota mental: tenho medo de altura, alguns já sabem. Ok, escalo montanhas, rochas, mas o medo me acompanha. Bom, e tenho medo de avião. Esse já é um pouco controlado, mas medo é medo. Pensei, e concentrei no chamado. Vou.
No dia 02 de dezembro de 2016, Alphonse saltou da aeronave Pilatus Porter, da Skydiver Foz. O piloto? Thiago Peretti, um dos mais experientes paraquedistas do mundo. Os Jump Masters que saltaram com ele? Caveira e Jaju, dois monstros de Foz. Al comandou o paraquedas. Eu estava lá embaixo, na pista de pouso, tinha acabado de chegar do meu primeiro salto do curso AFF (Accelerated Free Fall). Estava extasiado, sem palavras, com um nível de descarga de adrenalina insuperável até então. Note, até então.
Logo acima, Alphonse vem navegando seu velame. Com tranquilidade, faz a mesma curva de 11 anos atrás em Paranaguá. Nesse momento, a pista estava com uma energia singular, todos os paraquedistas no chão se viraram para ele. Eu, da área de proteção, exausto, olhava. Finalizou a curva à esquerda, o paraquedas foi no fluxo. Próximo do solo, controlou o flare (freio) e suavemente pousou. Sem a necessidade de um passo a mais. Suave, feito pluma flutuando.
A pista explodiu de emoção
Saí correndo em direção ao cara. Escrevi que nunca tinha experimentado uma descarga de adrenalina tão grande quanto o meu salto, momentos antes do pouso de Alphonse, mas, ali, a descarga foi maior. Que emoção vê-lo expurgar um fantasma, cuidando do dito cujo! Que emoção estar presente e ter sido convidado para essa jornada!
Não tenho tantos heróis na vida, e aqueles que me inspiram, conto nos dedos. Geralmente, são pessoas comuns, como eu e você, que fazem coisas extraordinárias. São mentes que não subestimam suas próprias capacidades, e que estão abertas a dar novos significados pra vida.
Esse é o motivo de as sábias palavras do chef Gusteau terem invadido a minha cabeça na hora em que comecei a escrever esse texto. Escolhi usá-las pela simples razão de ser a metáfora perfeita pra dizer que somos ilimitados, que podemos, sim, “cozinhar”, realizar o “improvável”, fazer acontecer o que a mente, muitas vezes, nos obriga a pensar ser impossível. E nada é.
Nada é impossível, mesmo que pareça. Minha experiência, no dia 02 de dezembro de 2016, com Alphonse Voigt, me fez ter ainda mais certeza disso
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