Banner
Notícias
Emídia Felipe
Donos de casa não precisam de detalhes: eles sabem das dores de cabeça trazidas pelo eSocial, sistema criado pelo governo para unificar encargos sobre o pagamento de empregados domésticos. A dúvida fica em por que um sistema de conceito avançado e que tinha a promessa de facilitar a vida do empregador apresenta tantas falhas e ainda está incompleto três meses depois de lançado. De pouco tempo para desenvolvimento a muita gente envolvida, os problemas já fizeram a Receita Federal adiar prazos e ser obrigada a se explicar a cada nova atualização.
Os problemas podem ter começado antes mesmo do desenvolvimento. O eSocial foi criado não somente para empregadores domésticos, mas para gerir e simplificar pagamentos de encargos de todos os empregados formais, de todos os setores. Na verdade, o plano inicial do governo federal era disponibilizá-lo para os grandes contribuintes primeiro. A prioridade mudou com a lei que criou o Simples Doméstico. “A ordem de prioridade foi alterada por imposição legal, e a partir de junho de 2015, foi iniciado o planejamento e o desenvolvimento do sistema, adequando-o para esse tipo de empregador”, informou a Receita em nota ao JC.
Com isso, foram apenas quatro meses para desenvolver uma aplicação que teria mais de um milhão de usuários, em sua esmagadora maioria empregadores ainda leigos nesse tipo de sistema, além de ser uma plataforma que movimentaria informações de pelo menos a mesma quantidade de cadastros, o dos empregados. Tudo isso mexendo com bancos de dados de quatro órgãos federais: Receita, INSS, Caixa Econômica e Ministério do Trabalho. A presença dessas instituições também implicou na participação de profissionais de todas elas no planejamento, produção e manutenção da aplicação, embora a operacionalização desse conjunto de ações tenha sido feita pelo Serpro, estatal federal para desenvolvimento de sistemas.
A Receita – à frente dos posicionamentos sobre o assunto – afirma que quatro meses foram suficientes para desenvolver o sistema. “Os testes foram ocorrendo durante o processo de construção”, assegura o órgão, ao citar a metodologia chamada de “Ágil”. Entretanto, desde o lançamento, em novembro, as falhas acompanham as notícias sobre o eSocial. Tanto que, depois de ser adiado o prazo limite para cadastro de empregados, a data do primeiro vencimento do Documento de Arrecadação do eSocial (DAE) de 6 para 30 de novembro do ano passado, mesmo depois de a Receita garantir que essa prorrogação não ocorreria.
A partir daí, atualizações foram sendo inseridas praticamente dias antes dos vencimentos a que estavam relacionadas, como a do 13º salário: essa folha de pagamento foi liberada somente em 1º de dezembro, 10 dias depois de o empregador já ter entregue o dinheiro ao empregado e sete dias antes do vencimento. Até hoje, não é possível fazer a rescisão contratual via eSocial: é preciso fazer via Caixa Econômica e pagar o FGTS por fora. Faltam também parte das funcionalidades das férias e do salário família, além do desconto de faltas. A Receita considera que o volume de erros está “em um limite aceitável”.
Sem opção sequer para pedir ajuda, já que não foi criado nenhum canal específico de dúvidas para o eSocial nos órgãos, muitos usuários recorrem a serviços como o Legalizar Doméstica e o Lalabee. “O sistema que deveria ser simples ainda é muito confuso e gera muitas dúvidas. O patrão pena para conseguir manter as contas em dia”, comenta o sócio da Lalabee, Ricardo da Ponte. Ele lembra dos problemas mais recentes, quando não era possível entrar na folha do 13º de 2015 no dia 1° de janeiro deste ano – e o usuário era levado pra a folha de 2016. Depois, o INSS do 13º foi gerado em uma guia separada, causando ainda mais dúvidas nos usuários.
Diretora da Legalizar Doméstica, a contadora Luciana Peres conta que é preciso fazer ajustes “manuais”. “Vi que o cálculo estava errado e fiz ajustes manuais nos valores para o sistema aceitar. A cliente teve que pagar R$ 10 a mais, mas preferiu isso a ficar atrasada com o DAE”, conta Luciana. Ela afirma ainda que procurou a Receita sobre o caso e se surpreendeu com a resposta. “A pessoa que me atendeu me agradeceu e disse que eu havia ajudado a entender como contornar essa falha”, conta Luciana.
FALTA DE PLANEJAMENTO
Mesmo afirmando que os quatro meses foram suficientes para desenvolvimento do sistema, questionada pelo JC sobre a quantidade de erros apresentada até agora, a Receita respondeu que “devido ao curto espaço de tempo para desenvolver um sistema com alta complexidade e criticidade (...) o sistema apresentou pouquíssimos erros, principalmente na fase inicial de implantação”. Ainda de acordo com o órgão, erros “foram corrigidos rapidamente”.
Para o professor da Unicap Antonio Luiz Cavalcanti, CEO da Smart Educational Services, sistemas do porte do eSocial correm grande risco de acumular “débitos técnicos” (technical debts). “Quanto mais interação humana, mais complexo é um sistema”, comenta o especialista. Os “débitos técnicos” são uma metáfora utilizada em tecnologia da informação para se referir a consequências de lacunas deixadas ao longo de todo o processo, do planejamento ao desenvolvimento, que vão acumulando “juros sobre juros” e gerando um passivo de erros que geram custos para serem consertados. Desse modo, quanto mais se adia o aprimoramento do sistema, maior o prejuízo. Para situações como a do eSocial, Cavalcanti acredita que podem ter havido falhas desde o planejamento e atacá-las de forma isolada não é suficiente. “É preciso reprojetar o que for necessário.”
Já o diretor da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco), Luiz Benedito, pontua também questões estruturais internas da Receita para o problema, como restrições em liberações de diárias para auditores para viagens a trabalho e treinamentos insuficientes e instáveis via teleconferência. “Em uma delegacia pequena, com cerca de 40 auditores, só um ou dois têm noção”, relata.
A Receita informou, ainda, que até agora foram implantadas quatro atualizações e, ao responder sobre quantas ainda faltavam, relatou que “como o sistema está em um contínuo processo, visando atender da melhor forma possível toda a sociedade Brasileira, iremos implantar quantas versões forem necessárias para que o eSocial cumpra a sua missão institucional”. De todo modo, resta aos empregadores domésticos se manterem como testadores do eSocial, uma vez que o uso por parte das empresas já foi adiado diversas vezes e não há previsão por parte da Receita para que esses módulos sejam lançados.
Sistema que reúne encargos sobre pagamento de salário dos domésticos apresenta diversas falhas desde o lançamento
Novidades
-
• Fim do MEI? Lula anuncia regulamentação destes trabalhadores informais
O regime do MEI (Micro Empreendedor Individual) é um esquema que unifica o pagamento de impostos, e incluí a contribuição previdenciária. Não à toa, a cada ano milhões de novos empreendedores regularizam suas empresas usando esse modelo.
• Já declarou seu Bitcoin? Supercomputador da Receita fecha o cerco à sonegação do Imposto de Renda 2023 O sistema T-Rex viabilizou a tecnologia que permite ao Fisco entregar a todos os contribuintes a declaração pré-preenchida, a grande novidade deste ano. • Imposto de Renda 2023: Entregas começam hoje (15); veja cinco principais mudanças no Leão O prazo para a entrega das declarações do Imposto de Renda 2023 começa nesta quarta (15). • Quem é obrigado a declarar o Imposto de Renda 2023? Lista foi atualizada este ano; confira A lista das pessoas físicas que deverão prestar contas com o Leão neste ano foi atualizada pela Receita Federal. Segundo informações divulgadas nesta segunda (27), uma das principais novidades do Imposto de Renda 2023 está atrelada aos pequenos investidores da bolsa de valores. • MEI se surpreende com mudanças na declaração do Imposto de Renda Embora a pessoa física e o empreendedor tenham que fazer esse processo, as regras são diferentes para cada caso. Nesse ano de 2023 a mudança mais significativa tem relação com o público alvo que deve crescer devido a falta de atualização das faixas de renda, e aumento do salário mínimo. • Receita Federal do Brasil notifica devedores do Simples Nacional As microempresas e empresas de pequeno porte devem ficar atentas para não serem excluídas de ofício do Simples Nacional, por motivo de inadimplência. • Receita anuncia renegociação de dívidas com até 70% de desconto em até 10 anos Empresas poderão renegociar dívidas com o Fisco a partir de setembro. • Demissões em massa na área de tecnologia: a bolha estourou? Os cinco principais fatores por trás do aumento do número de profissionais do mercado tech demitidos pelas empresas • Planejamento tributário para clínicas médicas promove ganho de eficiência financeira Além de diminuir a carga fiscal, o planejamento tributário colabora para que não haja descuidos que podem ser interpretados, pelo fisco, como ilícitos tributários. • MEIs: modalidade cresce no Brasil e mostra importância de apoio especializado O número de MEIs bateu recorde no País, mas ainda é necessário uma consultoria permanente para garantir a sobrevivência das empresas.